Mineirim pisciano com ascendente em Sagitário, da terrinha de São João del-Rei e cheio dos "uai", dos "trem", que gosta de uma pinga daquelas e com um ótimo (leia-se "ácido") senso de humor. Jornalista em treinamento, designer gráfico por paixão, geek por opção, nerd por imposição e chato por dedicação. Metaleiro, adora fotografias (mas só tira foto com o celular), publicidades criativas e de bater uma boa prosa.
Savy?
Enquanto ia para casa, no meu horário de almoço, passei por várias pessoas sendo que a maioria delas eram crianças. Apesar de estar um tanto quanto distraído, não pude deixar de ouvir de uma mãe a seguinte expressão (embora não sejam exatamente essas palavras, mantenho-me o mais fidedigno possível com o teor da mensagem):
"A gente vê umas barbaridades que acontecem com crianças, mas tem hora que eu mesma penso em fazer uma besteira. Criança deixa qualquer um doido! É umas coisas que acontecem que a gente acaba vendo que no fundo, algumas coisas têm motivo para ter acontecido."
Ora ora... Quer dizer então que a criança é culpada simplesmente... Por ser criança? É justificável espancar alguém — alguém com meros cinco ou seis anos de idade — simplesmente por ser desobediente? Aliás, essa tal desobediência, não deriva do fato dos pais, quase sempre, faltarem com noções básicas de respeito, imposição gradual de limites, ser a referência que norteia aquela "folha em branco" que toma forma dia após dia?
Não psicólogo nem pedagogo, apenas um observador às vezes irrelevante dos fatos que acabo vendo aqui e ali. Mesmo que essa mãe tenha dito o que disse apenas no calor do momento, eu ainda acho que isso é preocupante: se em um momento simples ela pensa essas coisas, será que numa dada situação crítica, ela realmente não poderia ter uma atitude inumana? Não é questão de exagero; as pessoas são imprevisíveis, e elas só se dão conta disso quando a situação realmente está crítica.
Mal da geração Y? Gradual incapacidade dos pais serem pais? É torcer para a coisa melhorar, senão...
Essa semana, eu estava indo para o trabalho quando eu vi uma moça, muito bonita por sinal, em trajes de academia (embora muito discretos) seguindo tranquilamente pela rua. Um rapaz passou de moto, e me surpreendeu a quantidade de "elogios" que fez à mulher; embora eu não tenha sido capaz de entender por conta do capacete que ele usava e da distância, claramente eu vi que de elogio não tinha nada. A moça meio que se fechou, e procurou nas músicas que ouvia uma distração qualquer para aquilo que ela tinha ouvido e e ignorar a tolice que o cidadão tinha lhe dito.
O rapaz, ao passar por mim, me olhou com uma cara claramente satisfeita (como se tivesse salvado alguém), mas como eu o encarei com desaprovação, ele mudou a expressão para algo do tipo "e daí, ela gosta disso". E foi embora.
Isso me deixou triste. Não é a primeira vez que isso deve ter acontecido com essa moça — nem com várias e várias outras mulheres, rotineiramente —, mas eu sempre me pergunto: esse cara gostaria que fizessem isso se fosse uma filha, irmã, namorada ou noiva dele? É tão difícil se colocar no lugar do outro? Melhor: é tão complexo ter respeito pelo outro?
Isso foi na terça, bem cedo. Durante a semana, vi isso se repetir de forma muito clara, apenas de métodos diferentes, em vários locais, movimentados ou não.
Desanimei da humanidade mais uma vez nessa hora.
***
Fui buscar uma cartinha de criança para apadrinhar nos Correios aqui da cidade, ontem, sexta-feira. Passei no trabalho de uns amigos meus, arrastei dois caras comigo fomos na agência dar uma olhada. O atendimento foi rápido:
— Bom dia. Gostaria de saber se preciso enfrentar fila para ver algumas cartinhas de crianças, para o Natal.
— Bom dia senhor. Precisar precisa sim, mas não há necessidade mais, porque todas já foram apadrinhadas.
O moço sorriu, satisfeito. Deu pra ver na expressão dele uma certa satisfação, como se estivesse fazendo parte de um projeto bacana e útil para todos. E como de fato era: como não se sensibilizar quando você pega uma cartinha e uma garota de sete anos pede pão com mortadela e coca-cola para ela e a irmã? Ou outra, de um rapazinho de seis, querendo carne com batatas? Ou ainda, uma menina de cinco, querendo ganhar arquinho de cabelo e esmalte, porque "não se sentia bonita como as coleguinhas"?
Fiquei surpreso, e feliz. Muito feliz.
Reapaixonei-me pela humanidade mais uma vez nessa hora.
Escrever | v. tr. | v. tr. e pron. | v. intr. | v. pron.
es·cre·ver |ê| - Conjugar verbo transitivo
1. Pôr, dizer ou comunicar por escrito.
2. Encher de letras.
3. Compor, redigir.
4. Ortografar. (...)
7. Dirigir-se por escrito a alguém. (...)
8. Representar o pensamento por meio de caracteres de um sistema de escrita.
9. Formar letras.
10. Ser escritor.
Definições do Dicionário (im)Pessoal: 1. Pensar, pensar e pensar sobre o quê redigir no papel ou computador, quase sempre sem sucesso;
2. Indecisão sobre como começar;
3. Vergonha do que escreve, insatisfação, frustração consigo mesmo;
4. Ter mil e uma ideias na cabeça, mas nenhuma capaz de sair dela;
5. Exercer sua criatividade através de um método cujo qual você não domina;
6. Temor em errar feio uma palavra ou expressão, e receber chacota prontamente por isso;
7. Hobby necessário, mas difícil.
*** O Dicionário (im)Pessoal são conceitos de palavras corriqueiras mas que, ao contrário do livro tradicional, foge à regra por permitir interpretações diferentes por cada um que leia aquele termo. Fica a pergunta: o que a palavra da vez lhe traz de experiências, memórias ou sensações? Comente!
Feliz 2015, que já começa com vinte pessoas mortas ao todo na França em função da intolerância religiosa em prol de um deus que prega a paz e união entre os povos.
Feliz 2015, que também mostra uma mídia que acha que pode publicar qualquer coisa de qualquer um "em nome da liberdade de expressão" e espera nunca ser reprimida contra isso. Censura, dizem em todo lugar, doa a quem doer.
Feliz 2015 para as mulheres que ainda são consideradas de "menor valia" dentro da maioria das organizações religiosas existentes mesmo sendo uma delas escolhida e deu origem ao "salvador".
Feliz 2015 para ateus que são considerados umas das minorias mais indesejáveis do Brasil. Mesmo quando você não mata ninguém por uma entidade cósmica que você acredita - nem nunca viu.
Feliz 2015 para negros e homossexuais, que também são pária rente à sociedade, mas ao contrário dos ateus, é mais difícil esconderem o que são.
Feliz 2015, quando se tem uma estrutura religiosa vigente que segrega, pune e visa dinheiro acima de tudo, deixando escorrer entre os dedos conhecimentos medievalescos e tratamento humano beirando a zero. "Em prol do rebanho".
Feliz 2015, lembrando que deus se esqueceu da África e de outras regiões exploradas ao talo. Porque o importante é garantir o carro novo, a TV LED de 50" ou tomar conta do que o outro faz com o próprio corpo.
Feliz 2015 pra mim, porque apesar de eu não roubar, sonegar, matar, estuprar, furtar, blefar, intimidar, torturar ou fazer qualquer outro mal a alguém, ainda assim mereço ir pro inferno (seja qual deles for) porque tenho tatuagem, transei antes do casamento, como carne de porco e não acredito em deus.
Fato: seja numa mesa de bar, na casa de alguém ou perambulando na rua, basta alguém comentar de algum jogo antigo que uma enxurrada de opiniões começam a pipocar de todos os lados. E foi pensando nisso, já que sempre presencio este tipo de assunto, que me veio em mente de escrever como eu acho que os jogos das gerações antigas foram muito mais benéficos para mim que os atuais - sem qualquer tipo de menosprezo, claro, até porque, muita coisa de hoje eu não joguei.
1. Aprender a se virar sem instruções de qualquer tipo
Pegue a maioria dos jogos de SNES, Mega Drive, Master System ou PSX: quais deles tinham algum tipo de tutorial lhe explicando alguma coisa, qualquer coisa, desde os comandos mais básicos aos mais complexos?
Certo, certo. Há sim alguns jogos que lhe oferecem algum tipo de instrução elementar, mas na maioria das vezes, bastava colocar o jogo no videogame, esperar carregar, apertar Start e mandar ver; mesmo aqueles que tinham algum meio de ensiná-lo a jogar também não era necessariamente simples. Em poucos minutos, você já se via em meio a tiroteios frenéticos ou aventuras cabulosas e terrivelmente difíceis.
Era uma época que sem Internet, ou você conseguia ajuda com alguém que já passou por aquela parte do jogo que você está agarrado ou conseguia uma revista lhe descrevendo passo-a-passo o que fazer (os famosos detonados). Ou seja: você se virava.
E sem discussão.
O vídeo abaixo é um dos meus preferidos. É grandinho, mas mostra exatamente o ponto da coisa usando a série Mega Man como exemplo:
Quantas vezes você já zerou um jogo e descobriu só mais tarde que havia um comando ou habilidade que, se soubesse na época, facilitaria (e muito) sua jornada? Assim também não funciona rotineiramente no trabalho, no social, na família, no ato de aproveitar oportunidades que surgem do nada?
E foi assim que aprendi a levar a mecânica gamer old school para minha vida adulta: as pessoas vivem te ensinando as coisas - muitas vezes de forma errada - e você só de fato aprenderá o que e como fazer na prática, no calor do momento. Não é culpa delas (sempre), mas não necessariamente o que elas fizeram que deu certo também dará para mim. Sem muita conversinha: ou aprende e se adapta ao contexto ou fica para trás, o que nos leva ao ponto de que...
2. Tudo é uma dificuldade constante
Muitos jogos antigos não tinham sequer opção de escolher alguma dificuldade. Às vezes, no máximo, você ia nas opções do jogo e aumentava suas vidas por lá e só, o que nunca garantia necessariamente que você sequer chegaria ao final: quem jogou R-Type ou Darius, aqueles joguinhos de nave de scroll lareral sabe bem o que estou dizendo.
Darius Twin: joguinho porreta de difícil já na primeira fase
Não que os jogos atuais sejam fáceis, mas naquela época, até por limitação técnica, muitos segredos e a própria habilidade do jogador influenciavam em muito para que ele chegasse ao fim de um game. Era preciso reflexos rápidos, atenção e muita perspicácia para perceber aqueles píxels levemente de cor diferentes ali estão indicando uma parede oculta. Pegue Mega Man 1 e 2 de NES (quando ele nem carregava o tiro) ou Crash Bandicoot de PSX (para conseguir todas as gemas) por exemplo.
Contra III: como descabelar um jogador de tanta raiva
Sem save states de emulador, no máximo alguns continues. E a tela de Game Over era muito, muito frequente de se ver.
Não muito diferente, se for pensar, do meu dia a dia. Claro que eu sempre tento arrumar um jeito de fazer as coisas da forma mais simples possível, mas como quase nada depende da gente, não adianta "xingar os controles ruins": ou você se vira com aquilo que tem, ou pode desistir para que outro jogador entre no seu lugar.
É aquele caso: apesar de tudo ir contra, não vou saber como o jogo termina se não continuar, mesmo aos poucos, avançando pelas fases. E assim funciona na vida em si.
Mas a dificuldade de tudo é agravada ainda mais porque, no meu trabalho rotineiramente os...
3. Recursos são escassos
Até hoje eu tenho a mania de enquanto estar jogando alguma coisa, economizar o máximo de recursos possíveis, mão-de-vaca mesmo. Aprender a gerenciar e tomar decisões dentro de um cenário de jogo é muito importante, tanto para poder evitar um problema quanto para sanar os danos dele caso irremediavelmente ele aconteça. Pegue Sim City, com as catástrofes que acontecerão em sua cidade lindamente construída e você tem exatamente o quanto é importante se preparar para momentos de necessidade.
Não é a toa que os gamers são geralmente bem sucedidos por conta de suas habilidades dentro de um cenário empreendedor.
Quem jogou os jogos mais antigos da série Resident Evil ou Silent Hill sabe como é importante saber carregar itens certos na hora certa.
Starcraft, Warcraft, Age of Empires, Command & Conquer... Jogos de estratégia militar que também utilizam gerência de recursos e rápida ação do jogador antes que seja dominado pelo exército rival. Top Gear eu sempre pegava o carro branco porque ele consumia menos, e ainda me lembro das melhores pistas que ele não precisa parar para abastecer.
Saber gerenciar alguma coisa - talento de pessoas ou suprimentos de qualquer tipo - é imprescindível na vida de qualquer pessoa que tem fontes de recurso restritas. Em geral, meus amigos e eu não ganhamos relativamente bem para nos sustentar e depender minimamente possível de nossos pais, mas ainda assim temos que pensar duas vezes antes de gastar a mais em um determinado mês para não sobrecarregar os outros. No trabalho, no meu especificamente, normalmente as ideias que os clientes tem para criação de materiais gráficos não casam com orçamento que eles dispõem. Há quem trabalhe com muitas pessoas, que precisa ainda organizar os respectivos talentos e egos para que a equipe dê resultado. Tudo que, por fim, está ligado a atitude de...
4. Valorizar relações
Pegue os excelentes RPG's antigos: Final Fantasy (até o X de PS2), Dragon Quest, Chrono Trigger/Cross, Legend of Dragoon, Terranigma, Grandia... Se puder jogar algum deles, perceba a interação que existe entre os personagens.
Pegue meu preferido, Final Fantasy III (o VI no Japão). Veja os objetos de cada personagem, a relação de amizade e amor, a importância da família e dos amigos em momentos de crise, e você terá, mesmo dentro daqueles pixels simples, um valor pelo humano tão grande que você se sentirá falta daquilo no seu dia a dia. Quem não jogou ainda sugiro jogar e descobrir a missão de Locke, a relação de Shadow, Relm e Stragos, a decisão de Sabin em abrir mão de ser príncipe enquanto seu irmão Edgar teve que assumir o trono, a cena triste da tomada do castelo do cavaleiro Cyan...
Celes na cena da Opera House. Veja a cena completa aqui
São jogos que muito além de serem simplesmente jogos, mostrava relações crescentes do decorrer do jogo - assim como as nossas, na vida real, com as pessoas que conhecemos e depois nos tornamos amigos. Todo um curso em prol de um bem maior somente é necessário quando todos abraçam a causa, já que...
5. Quando bem feitas, ideias se tornam inspirações para outras que surgirão posteriormente
Se você acha que jogos antigos são sinônimos de coisas ultrapassadas, basta olhar essa lista aqui, aqui ou aqui e ver a quantidade de jogos da velha guarda existem nelas. Claro que listas são muito parciais, mas as coincidências
Coisas bem feitas duram. Tem valor, são respeitadas e tem seu lugar garantido dentro do seu contexto.
Nos videogames não poderia ser diferente, claro. Perceba que até hoje, mesmo com tanta evolução gráfica, boa parte dos times de programadores tem sua inspiração baseada em pérolas de dez, vinte anos atrás.
Pense rápido: você é capaz de dizer ou o nome do personagem ou do jogo que ele participa?
Selecione o texto entre as aspas para saber quem é este personagem: "Nathan Drake, da série Uncharted"
Mas certamente, mesmo que você não seja um gamer, quase saberá o nome deste aqui:
Selecione o texto entre as aspas para saber quem é este personagem: "Ryu, de Street Fighter"
Bônus: o poder da interação social
Só como adendo, ao contrário dos jogos de hoje, antigamente era necessário que dois ou mais jogadores estivem ali, ao vivo e a cores, para jogarem juntos. A zoação, diversão e a o valor disso naturalmente é uma coisa que Internet alguma pode oferecer.
Até hoje, meus amigos, minha namorada e eu nos encontramos para jogar alguma coisa - e quase sempre, acabamos por estar jogando alguma coisa antiga, mesmo com nossos poderosos consoles de última geração.
Os melhores jogos de XBOX por exemplo são aqueles que usam o Kinetic, e mesmo assim, grande parte deles só quando se tem alguém para jogar junto.
E em um mercado competitivo como hoje, saber respeitar diferenças mas também ter habilidade em interagir ao
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Games não são simplesmente entretenimento eletrônico - não somente na essência. São poderosas formas de desenvolvimento para crianças e adolescentes e até salvam vidas (aqui, aqui ou aqui). E eu sou muito feliz por ter tido a oportunidade de pegar essa geração antiga e entender que hoje, ter muita coisa que eu tenho, foi graças aos videogames lá da minha adolescência que auxiliaram este processo.
Eu já estava com um texto quase pronto sobre o PirateBay para postar, mas meu amigo que se mudou para São Paulo recentemente me mandou esse pequeno documentário que ele fez das manifestações contra o PT lá, no último dia 6.
Mas em vez de escrever qualquer coisa, deixo aqui o vídeo, que fala por si só. Menos de cinco minutinhos.
Assista atentamente:
Destaco:
Não temos nenhum partido de direita no Brasil, todos são de esquerda;
Este movimento é espontâneo e apartidário [segue imagem do Serra];
FHC é mais comunista que o Lula [?].
Acho que nem preciso comentar sobre, confere?
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Apenas para facilitar a consulta sobre alguns termos:
*** Independente de qualquer coisa, friso minha posição quase que apolítica não por querer em ficar em cima da do muro, mas porque na verdade enxergo a maracutaia de partidos brasileiros que no fim, são tudo farinha do mesmo saco - que nação precisa de mais de trinta partidos políticos, minha gente?. Mas isso também fica para outro post.
Jonas certamente estava na pior. De todas as brigas que se metera, esta sem dúvida foi a mais grave. Largado na sarjeta perto da sua casa, sentia as costelas doendo e tinha um grave corte na testa, que sangrava até o olho esquerdo lhe tirando toda a visão deste lado. Tentou por duas ou três vezes se apoiar nas paredes imundas para ficar de pé, e quando finalmente conseguiu, sentiu dores na sua genitália. Não queria se lembrar do que aconteceu, embora invariavelmente recordasse cada frame.
Uma das últimas coisas que ainda poderia chamar de sua - seu próprio corpo -, já não lhe pertencia mais.
Tinha vontade de chorar e não podia. Quem ia acreditar na sua versão? Bem, um ou outro amigo ia dizer para que tomasse uma providência ou procurasse a polícia, mas no fim das contas, terminaria tudo do mesmo jeito. E pior: ao chegar em casa apanharia de novo, ou na melhor das hipóteses, sofreria uma agressão surpresa quando fosse trabalhar ou estudar, quando achasse que já estava se esquecendo de tudo que passara e as coisas voltando aos eixos.
O rapaz tinha medo de tomar uma decisão sobre o que fazer. Na verdade, ele nem se lembra de quando foi a última vez que pudera tomar uma por si só: era sempre julgado, sempre qualificado moralmente pelos mais fúteis motivos. O relacionamento em que estava no momento foi o pior deles nesse ponto, porque não fazia nada, nada mesmo, sem o consentimento do outro lado.
A violência sempre fora uma constante em sua vida. Quando pequeno, era obrigado a se portar de acordo com o que queriam, e cresceu com várias dúvidas sobre si mesmo, sem que tivesse confiança sequer em procurar saná-las. Foi na internet que conseguiu algumas respostas, mas já era meio tarde: viu que amigos e colegas se portavam diferente do jeito dele e às vezes eram até mais livres, embora sofressem também uma carga de repreensão explícita e eram vistos como escandalosos pelas outras pessoas.
Jonas às vezes até tenta lutar contra isso tudo, mas nada dura mais que alguns dias. Até porque tudo que ele sofre não é só dentro de casa: é normalmente menosprezado no trabalho, no trânsito e até quando precisa pegar um metrô ou um ônibus.
As pessoas pensam que violência é dar um tapa na cara, um tiro, assaltar, sei lá. Mas no fim das contas, violência é você deixar de ser si mesmo, certo? Ou então, deixar de contar para aquele carinha que ele lhe deu troco a mais, ou furar uma fila, ou ainda ficar com um produto que chegou em sua casa por engano...
Mas fazer o quê, era um trapo humano, com o orgulho em frangalhos e a humilhação marcada na pele. O resto é resto: é se arrastar até em casa e torcer para que amanhã as dores estejam menos latejantes para poder ir trabalhar amanhã.
A vontade de chorar ainda não passara.
- Demorou, Jonas - ouve-se o som de uma lata de cerveja sendo aberta.
O som da TV quebra o silêncio do local.
- Desculpa meu bem, estive...estive m-me recompondo.
- Será que não foi encontrar alguma colega sua?
- C-claro que não... Você está com meu celular inclusive...
- E quem garante que você não pode fazer nada sem celular?
- M-mas eu juro, não fiz nada... E-estava onde você me... Me deixou agora a pouco.
- Você está horrível. Vá lavar essa cara e se arrumar.
- T-tá bom.
- Você é meu namorado, e deve se portar como tal. O que os outros vão pensar de você se ficarem vendo conversando com outra mulher à noite por aí?
- N-não vão gostar...
- Certamente, e eu menos. Meu bem... Você sabe que eu te amo e me preocupo com você... Às vezes passo dos limites, admito... Mas é para o seu bem.
- Sim, eu sei...
- Pois é. Desculpa por ter agido assim... E ter lhe acertado tão forte.
- T-tudo bem.
O rapaz sobe e vai até o quarto, de olhos marejados. Olhando-se no espelho do banheiro, ele vê seus machucados e entende que é fadado a viver assim. Se sente um lixo total, mas alguma coisa lhe faz ir pra frente. Talvez, Deus...
- É a mulher que eu amo... Eu acho. E como ela mesmo disse, se eu largá-la não vou encontrar mais ninguém...
*** Achou um pouco estranho esse texto? Veja só: de acordo com um estudo que saiu essa semana, 68% dos jovens brasileiros de idade entre 16 e 24 anos acreditam que mulheres não deveriam ir para a cama no primeiro encontro, 76% criticam o fato delas terem vários ficantes, 48% acham errado dela sair sem a companhia do namorado ou ficante, sem contar a grande parcela delas que tiveram de desfazer amizade ou tiveram sua privacidade violada por conta de um namorado ou ficante. Ou seja: a pesquisa mostra que o jovem brasileiro reconhece que o machismo existe, mas ele pouco ou nada faz para combatê-lo. E pior, se acha no direito de tomar para si a liberdade do outro, mais especificamente, da mulher. Ciúmes? Antes fosse... E ainda tive que acompanhar nesses dias,
Em pleno 2015. Não, não sou um militante feminista, nunca fui. Na verdade, na minha opinião, a grande maioria dos movimentos feministas hoje estão completamente descaracterizados, lutando por coisas que mais parecem com caprichos pessoais do que de fato uma busca pela igualdade de gênero e gerando coitadismo. São necessários? Claro, mas gerar incômodo colocando crucifixos na vagina e quebrando imagens sacras por exemplo não ajudam em nada a validar a integridade da causa. Mas isso é assunto para outro post. Mas sou militante do respeito independente de gênero, orientação sexual ou qualquer coisa que preze a liberdade do outro. Milito pelo direito da minha mãe, minha irmã, minha namorada, minhas amigas, enfim, das meninas e mulheres poderem andar na rua sem terem que temer se serão atacadas verbal ou fisicamente, sem serem julgadas por um short ou vestido ("mas você está pedindo!") ou mal faladas simplesmente por terem gostos diferenciados da maioria. E não escrevo isso tudo direcionando a homens: também quero que as próprias mulheres que ao mesmo tempo são vítimas e algozes dessas afirmações infelizes, dentre muitas outras, entendam que possam ser livres de dogmas e passem a ser capazes de agir do jeito que melhor lhes convier. Não adianta descobrirmos a cura da AIDS se a gente julga nossa vizinha solteira porque ela gosta de sair e ficar com vários caras, enquanto quando um homem faz o mesmo ninguém não está nem aí. Também faz pouca diferença irmos ao espaço se a roupa que alguém usa continua definindo o que ela é - mesmo sem conhecer sua usuária. O problema mundial com as drogas me parece peixe pequeno quando uma mulher desperta ojeriza simplesmente por ter uma vida sexual livre.
Tem horas, que sinceramente, acho que a doença do mundo realmente somos nós mesmos.