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5 de jan. de 2016

Encoraje um artista


 
 
 



4 de jan. de 2016

[MICROCONTO] O Homem do Chapéu Negro

Demorou muitas luas, mas finalmente o Homem de Chapéu Negro chegara ao velho moinho. Envolto sob uma noite escura e brumosa no charco lodoso, pútrido e cercado de árvores secas e anormalmente retorcidas, é nítido que nem mesmo a neve ousa tocar o solo daquele lugar: tudo que restou de uma antiga vila agora se resumia somente, e tão somente, na construção decrépita de pedras negras e irregulares que suavam corrupção a olho nu em uma elevação no terreno cuja trilha que leva até a porta de entrada o tempo quase apagou por completo. O cheiro de morte, os corvos curiosos com o visitante, a água podre que formava uma lama pastosa e escura que sujavam quase aos joelhos do caçador, os pedaços de gente apodrecendo junto a tufos de grama e vermes do tamanho de um dedo polegar não deixavam dúvidas que ele alcançou o covil da bruxa.

Mas não era de uma simples feiticeira que o Homem de Chapéu Negro estava atrás: a criatura que ele caçava era asquerosa, grande, embora andasse arqueada e com sua coluna fazendo quase noventa graus. Ela usava um tipo de magia desconhecida, atraindo as pessoas para próximo de seu covil, e uma vez que as alcançasse, arrancava seus olhos e fazia coleção deles, e comia outras partes do corpo. As vítimas preferidas dessas bruxas eram as grávidas e as crianças, e seus ossos virariam cálices e ferramentas de bruxaria espectral.

A única fonte de luz vinha da cintilante tocha mística que o Homem de Chapéu Negro carregava, uma chama que permitia a iluminação mesmo no caso de escuridões de origem profana; era uma lembrança que o fogo da vida existe mesmo naquele cenário horrendo. Pela última vez, ele checa seu rifle, um Bridesburg Model 1861, arma de tiro único mas confiável, precisa e carregada com sua bala de prata especialmente feita para atingir caças que são resistentes a tiros convencionais. Também confere suas Colt’s, munição para as mesmas e suas bombas alquímicas, previamente preparadas para diminuir o poder mágico da profanação prestes a combater.


Sua melhor arma, no entanto, era Aurora, um sabre finamente fabricado e com uma lâmina tão brilhante quanto à luz da lua, tão bem límpida que mal parecia que ela já tinha se sujado como sangue e vísceras de tantas criaturas profanas. Ninguém sabe o porquê da sua espada ser chamada assim, mas não havia também aquele com coragem para perguntar. O Homem do Chapéu Negro não respondia nada que não fosse relacionado a sua próxima caça ou recompensa, e todos tinham medo dele, onde quer que fosse, mesmo se fosse chamado para o pior dos casos.

Tudo perfeito, exceto por um detalhe: embora não carregue a petulância dos caçadores novatos, sua esperança de volta era diminuta. Influência da criatura? Talvez... Mas como caçador, e portador do Chapéu Negro, a esperança é algo que definitivamente não foi feita para ele, e sim para outros que dependem do sucesso da sua caça. É perda de tempo acreditar que ele possa sair vivo de qualquer missão, enfim; caçadores são feitos para isso, e de um jeito ou de outro, morrer pelas garras, presas ou feitiços, considerando ainda uma morte rápida, é o melhor destino que qualquer Homem de Chapéu Negro pode esperar.

Ele beija sua espada com toda a ternura possível, e salta em direção a parte baixa, onde há muito havia o curso de um vívido riacho hoje apenas lembra um fino curso de água fedorenta. Ele vai em direção ao caminho de entrada do velho moinho e quanto mais se aproxima da entrada, mais é possível escutar o estalar da madeira de dentro da construção, o gotejar da infiltração cair como tiques de relógio, assim como suas hélices que como em uma sobrevida tentam se mover.

Será uma longa noite...