Olhando para o líquido amarelo dentro do copo americano típico, sente o gélido recipiente molhar a ponta dos seus dedos até algumas gotas escorrerem e caírem como bombardeio na toalha de mesa xadrez que recobre a mobília. Sempre às sextas, uma parte dele morre e vive ali.
Sozinho, cada gole da bebida amarga e dourada lhe traz um amor ganho e outro que perdeu, um sucesso e uma falha, uma música e um silêncio, tudo tão intenso que a sensação chega às vezes a lhe arrepiar os cabelos. O local abafado, as milhares conversas paralelas disputando atenção entre si, o cheiro da comida de boteco e as músicas aleatórias da rádio local, nada disso de fato interfere no diálogo com seu passado, visível somente dentro daquele copo.
Admita: você quer uma delícia dessa agora! |
O saudosismo de tudo arranca-lhe um sorriso bobo do rosto, mas é sincero, desejoso de poder voltar no tempo e arrumar algumas coisas aqui e ali - e deixar outras bagunçadas mesmo. Tudo é um caos, ele não sabe se vai sair bem, então pra que se importar?
A cerveja é sua melhor amiga nessas horas. Não reclama, não questiona, escuta seus desabafos mentais e assiste suas engraçadas expressões físicas como uma plateia atenta que acompanha um espetáculo chique. Pensando bem, ela esteve sempre presente na sua vida: o primeiro porre da sua vida começou com duas latinhas (e não sabe o que foi mais inesquecível: o esporro da sua mãe ou a ressaca no dia seguinte); sua primeira namorada ele conheceu depois de uma intensa "cervejada", várias amizades fez e refez nas mesas de bar regradas a fritas, queijo e bacon. Rodas de truco e a velha discussão Raposa x Galo também sempre estiveram aguadas com a graciosa cervejinha.
Morrer e viver no boteco.
Ou viver e morrer na saudade.
Que diferença faz?
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